sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

O chamado



Antes daquele encontro, éramos meras colegas. Mulheres que se cruzavam pelos corredores e trocavam gentis cumprimentos, quando isso. Às vezes, uma ou outra se encontrava na copa e falavam dos filhos, da vida, superficialmente - naquela superficialidade confortável das pessoas que não se conhecem profundamente, que não compartilham nada mais além de café e cinco minutos de bate-papo. Outras estavam ali há séculos e nunca haviam se visto. Coisas desses lugares grandes e abarrotados de gente, gente diferente a cada dia - abarrotado de gente que se mantém na sua confortável superficialidade e anonimato.
Como super-heroínas em uma missão secreta, todas fomos convocadas para “o chamado”. Me senti especial, integrada, importante, como se, finalmente, alguém tivesse um trabalho sério a desenvolver e a minha cooperação e competência fossem indispensáveis. Mal sabia eu, onde estava me metendo. Aliás, mal sabíamos nós. Todas nós. Sem saber absolutamente nada do que se tratava, fomos - inadvertidamente, fomos.
E então, estávamos ali. Desconhecidas, daquele desconhecimento que só era rompido pela proximidade das cadeiras e do formato circular da disposição das mesmas. E uma a uma fomos convidadas a entrar no mundo mágico de nossa realidade. Aquele trabalho, hoje realizo, seria o que de mais importante poderíamos fazer para nós mesmas e, mesmo sem saber de nada naquele exato momento, umas pelas outras.
Naquele primeiro encontro, saiu as entranhas. Cada uma de nós despejou o que de melhor e de pior havia dentro. Foram lágrimas, queixas, orgulho, cobranças, medos, mais lágrimas e segredos. Muitos segredos. Meus mais íntimos segredos. Os segredos de todas. Nos colocamos, uma para as outras - onde anteriormente só havia superficialidade e distância - e mergulhamos no mais profundo de nossas angústias. E quantas surpresas!... quantas similaridades e quantas discrepâncias e quantas dores... e como doeu! Se expor, se ouvir, ouvir o outro, sentir a dor do outro...
E naquele exato instante de mais profunda descoberta, nos tornamos todas cúmplices. Sim, cúmplices.  Cumplicidade é aquilo que a gente sente quando olhamos bem dentro do olhar do outro e sabemos que o outro nos entende e nos apóia. Não havia mais como não se envolver. Éramos parte daquele todo, e ele era necessário para que nós continuássemos seguindo no nosso chamado.
O tempo foi longo e passou. Algumas não se deixaram tocar pela grandeza do trabalho. Algumas fizeram falta, outras nem tanto. Algumas nos deixaram pra viver intensamente o motivo da nossa permanência ali. E pra umas, o chamado foi terapia, pra outras foi brincadeira. Pra mim, foi o início da minha cura.
Hoje nossa missão foi cumprida.
E nunca mais poderemos passar despercebidas umas pelas outras.
No corre-corre do dia-a-dia, nos esbarrões dos corredores, no café corrido da copa, saberemos nós, ao nos olharmos, o que traduz a nossa alma.
Porque a cumplicidade é assim. E só quem vive a experiência de se mostrar verdadeiramente pro outro, com suas fraquezas e fortalezas, vai entender o que de fato é ser cúmplice.

E só quem viveu a experiência e a liberdade de se expor vai ver o quão gigante cada uma de nós somos - mesmo dentro desse lugar grande, grande e abarrotado de gente: gente que não se vê, não se enxerga, não se sente...

Para Gê, Roberta, Tatiana, Aline, Márcia, Maitê, Flavinha, Flaviane, Karla, Patrícia e finalmente Elisa. Sem ela, essa experiência não teria sido possível. 

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

CAMPANHA CURAR LANA FULLER

Então, como alguns de vcs sabem, estou organizando um evento no Facebook chamado CAMPANHA DE APENAS R$ 10,00 PARA CURAR LANA FULLER (https://www.facebook.com/events/437339913048829/), pra arrecadação de doações pra uma menininha lá da Inglaterra. Os que me conhecem sabem o quanto sempre fui envolvida com as causas beneficientes (muito por influência dos meus pais, que faziam parte do Lions). Pois bem, esse texto é um pouco longo, mas necessário, pra que vcs se certifiquem da veracidade dos fatos, e possam ajudar de coração aberto, assim como eu ajudei.
Como conheci o caso
Conheci o caso da Lana pela internet e como mãe, não pude deixar de me sensibilizar. Esta mobilização é pra levantar fundos uma menininha de três anos, chamada Lana Fuller (filha da brasileira Maria Fuller com o inglês Peter), que tem uma doença na pele que ainda não foi diagnosticada (a principio, acreditava-se ser uma dermatite atópica aguda). Só agora depois de 10 meses de tratamentos paleativos, o NHS (sistema de saúde público de lá) fez o primeiro exame de sangue e cutura de pele e foi descoberto que a pele dela esta coberta com a bactéria estafilococos aureus. Essa bactéria é a mesma que causa sinusite e furúnculos. Além disso, Lana também contraiu uma bactéria na corrente sanguínea estreptococos do grupo A (bactéria que causa a faringite) que quando cai na corrente sanguínea pode ser letal - ela já esteve em estado de choque em uma das várias crises que teve, segundo os relatos de sua mãe. O sistema público de lá tem sido bastante omisso no tratamento dela. Omisso e desatento. Chegamos a levantar a hipótese de preconceito, por Maria ser latina e por não dominar muito bem o inglês.
Para me certificar da veracidade do caso entrei em contato com a Katya Ceci Ribeiro, brasileira que tb mora em Londres que se prontificou a ajudar a Maria. Katya é prima de uma amiga do meu trabalho (Márcia Gitahy), o que me deu maior segurança. Katya me mantém informada diariamente por msgs ou por skype - a mim e a outras 5 mães que assim como eu, se predispuseram a ajudar. Ela tem acompanhado Maria as consultas e as idas ao consulado para agilização da documentação das meninas.
Como começou a campanha?
A idéia de Maria, no auge do desespero, era vir pro Brasil tratar da Lana no SUS (pra vcs verem a que ponto ela chegou). A princípio iria pra Manaus, onde uma amiga já tinha uma equipe médica acompanhando, no Instituto Alfredo da Mata e dispostos a tratar da Lana gratuitamente. Porém decidiu ir pra Recife, sua cidade Natal, onde possui parentes que poderiam auxiliá-la tanto emocionalmente quanto cuidado das filhas, além de já ter alguns contatos com os médicos do IMIP de Recife. Maria lançou um vídeo na internet que mostra as escaras na pele da filha e Lana chorando e gritando que estava morrendo, enquanto ela tentava ministrar as loções para cuidar da pele. O problema é que há 10 meses, Lana se coça e sangra e só consegue dormir poucas horas por noite. Com isso começou a campanha CURAR LANA FULLER. Existe uma página na internet destinada a relatar os fatos e o andamento do tratamento. Maria tenta os manter atualizados, mas nem sempre consegue.
Por que se precisa de dinheiro?
Maria precisa de dinheiro para o tratamento de Lana, que pode ser no Brasil ou na Inglaterra. Depois de 10 meses dando cabeçada na rede publica de lá, ela só obteve o primeiro resultado de inicio de um diagnostico com um médico privado (Dr. Gideon Lack) onde só a consulta do médico foi 300 libras, o equivalente a R$1,073 (fora os exames e as passagem para ir a Londres). Esse médico, através de um teste, já disse que a menina não é alérgica a nada (foi ele que fez a cutura e descobriu a bactéria da pele). Hoje ela foi a um dermatologista infantil (Dr. Harper) que foi tão caro quanto ao primeiro especialista. Além da consulta ainda são gastos muita grana com exames e transporte, pois Maria e as filhas moram numa cidadezinha chamada Stoke-a-Trent, que fica 2 horas de Londres. 
Caso Maria decida trazer Lana para se tratar no Brasil, precisará de dinheiro para as passagens, que estão custando na faixa de R$7,000 para duas pessoas, pois a mais nova, Louise, ainda poderá ir no colo. Katya nos mandou uma msg dizendo que a consulta foi boa e tem ótimas notícias. Estamos aguardando.
Maria, ao longo desses 10 meses já esgotou suas reservas com testes de medicamentos.
Ah, vale ressaltar tb que a família do marido não tem posses e o marido não é muito atuante no suporte a Maria e as filhas (provavelmente uma questão cultural).


Então, depois desse blablabla todo, como se pode fazer pra ajudar?
O site pra doações está fechando hj. Lá tem o vídeo que mencionei anteriormente e pode-se se doar, em dólares, por cartão de crédito internacional. Acho que é a forma mais transparente pois vc pode doar e se identificar. E é bem facil tb.


Na conta de Maria (o titular da conta e um primo dela)
Kleber Noberto de Amorim
CPF: 696627384-87
BANCO SANTANDER (BRASIL) S\A 033,
Agência: 4015
Conta: 01.000483.8
Neste caso, peço pra que me enviem o comprovante da tranferência ou do doc pra termos o controle do que está sendo doado. Maria não tem muito tempo pra nos atualizar as doações que entram.

Maria tb mantém um blog onde relata sua saga desde o início do tratamento da Lana:
http://lanafuller.blogspot.co.uk

E aí vc me pergunta se entre dois filhos, um marido, um emprego, organização de festas e dois cachorros, eu não tenho já muita coisa pra me preocupar na vida. Sim, tenho, mas de alguma forma essa causa me tocou profundamente. Olho as fotos de Lana e penso imediatamente nos meus filhos e na saúde plena que eles possuem. E acredito VERDADEIRAMENTE que esta pode ser uma forma de agradecer a Deus tudo que tenho.

Conversando com uma amiga sobre isso, ela me disse: o que importa é se importar.

Ainda acredito na bondade e na caridade.
Ainda acredito no outro.
Ainda me importo.

E se vc tb se importa, me ajude a ajudar a Lana. Só R$ 10,00 já farão a diferença.
Bjs

Sandra

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Reencontro

Texto antigo na gaveta dos achados e perdidos. Um pouco coberto de pó, mas repleto de luz. Quer falar. Sai da gaveta e se mostra. Por si só.

Já era tarde e ela continuava sentada, sozinha, no meio do todas aquelas pessoas. Como ela estava dirigindo – a promessa é que ela o levaria de volta pra casa, já que marcaram em lugar perto – se permitiria somente um chopp, no início do papo, que ela esperava ser evaporado durante o passar das horas. As pessoas deveriam se questionar o que ela estava fazendo ali sozinha – sentada em uma mesa no fundo do salão, entre casais e grupos de amigos animados, se distraindo nos joguinhos do celular e bebendo água, ora olhando pra rua, ora pra TV de plasma a sua frente – enquanto o burburinho do início daquela sexta-feira ocupava aquele bar lotado na Zona Sul. Ela estava esperando – não tinha como disfarçar, estava ansiosa – ele chegar.

Há quanto tempo não se viam? Uns 4 anos, pelo menos?... A última vez, havia sido na calçada, numa noite de verão, em frente à farmácia: ela voltando a pé pra casa, ele conversando com um amigo. Uma troca de poucas palavras e sorrisos, meio desconexos e travados, e menos de cinco minutos depois cada um voltava para dentro do seu universo: onde o outro não pertencia mais, já fazia um longo tempo...

Ela, por conta de uma informação profissional, tomou a iniciativa de procurá-lo. Um encontro casual pela internet resultou em horas de bate papo, primeiro na tela, depois pelo telefone. Foi bom rirem novamente juntos, descobrirem o que haviam feito nesse período de total ausência, e descobrirem que, por mais que a passagem de um na vida do outro houvesse sido desastrosa, ainda restaram muitas coisas boas para se lembrar... deu uma vontade de estar junto novamente...

Finalmente, ele chegou e veio em sua direção... Parecia feliz em reencontrá-la... Os cabelos grisalhos acentuaram a certeza de que, apesar da ansiedade insistir em transformar em segundos, foram muitos os anos de ausência... Sentiam-se adolescentes, quando ela, enfim, pediu o chopp e brindaram ao reencontro...

O papo foi interessante. Falaram sobre quase tudo – os anos que passaram e o que fizeram, novos amigos, novos amores, trabalho, situações divertidas e perdas... e sem mais nem menos, no meio daquele burburinho e tintilhar de copos, ele a olha no fundo dos olhos e  fala do que sentiu. Do que sofreu, do que chorou. Do quanto ela foi importante, do quanto duvidou de tudo. Ela chorou. Chorou pelo que esqueceu. Pelo que fugiu, pelo que perdeu. Chorou pelo que duvidou.

Ela achou bom poder sentir os dedos entrelaçados novamente. Se olharem sem mágoas. O tempo havia sido sábio, toda dor havia ficado pra trás e eles podiam estar inteiros um em frente ao outro novamente. Era um ponto final. Podiam enfim, continuar.

Nem que fosse continuar cada um com a sua vida, com as suas escolhas. Mas estar em paz com aquela parte tão turbulenta de suas existências, estar em paz com seu interior, estar em paz com o Universo. Continuar, cada um com seu caminho, mas de fato admitindo da importância inquestionável que um teve na vida do outro. “Closure”.

Saíram dali ainda atônitos. Na porta de casa, a hesitação do que fazer: não, ela não queria que ele se fosse de novo. Não, ele não queria perdê-la de novo... E então, ele se afastou andando... e se foi.

E dirigindo de volta pra casa, ainda atordoada, olhou pro céu e avistou a lua. Estava cheia, linda, redonda, robusta - bem em cima da sua cabeça - e parecia abençoar aquele reencontro.

Enfim, poderiam retomar suas histórias.

Ou começar outra nova.

Novinha em folha.